sábado, 10 de março de 2012

Estação de trem

(continuação de Clima)

Como um homem que escolhe uma estação de trem - ao acaso - para passar a eternidade: ver pessoas indo e vindo, preocupadas com o que fizeram de suas vidas, preocupadas com as consequências das atitudes que tomam - escravas de si mesmas.
Casais indo e vindo; famílias se reencontrando e se distanciando; amigos brigando e se reconciliando; histórias começando e terminando. A contagiante felicidade anônima: risos contidos e olhares discretos, contadores de histórias e seus protagonistas, beijos, abraços, dores e tristezas. Os extremos da condição humana presenciados todos os dias, por todo infinito. Os trens passam, com mais ou menos vagões, mas o homem está lá, sentado. Imperceptível. Poderia ser percebido - e talvez tenha sido - mas o cotidiano não manda flores a quem as espera, o ordinário é uma fria parede de concreto: a maioria encara, mas foge de seu encontro de tempos em tempos. O homem vê e sente essa parede sufocante todos os dias.

A solidão é o homem e a parede é a vida.

Porque? Porque tão cruel?

Em fuga a vida é uma cantata, uma eterna ode em tom maior. Em elucidação é o triste soneto em escala menor - o teor alcoólico inerente aos pensadores suburbanos, o vício da desgraça, o vício da tristeza.

É ambiência - o ambiente que cerca.


O homem que senta à estação todos os dias sabe da verdade, mas foca-se em si, em esperança de que a verdade mude. O presente, mutável.
Mas eis que o questionador é abruptamente interrompido: um homem de terno, sobretudo, chapéu e um rosto parecido com um limão - como imaginado por René Magritte - olhando a todo instante para seu brilhante relógio.

Preocupado.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Clima


(continuação de "Solidão")

"Sei lá, acho que é o clima de lá, já foi melhor..."
Sensibilidade. Uma característica inerente a qualquer um, mas especialmente presente em quem busca o isolamento. Contudo, consciente de seus sentimentos, quem o sente realmente o esconde.
Então seria de observar que aquele que mais busca a solidão é consciente de si, mas, ainda sim, incapaz de aceitar-se em serenidade, sempre conflituoso.
Insatisfação? Retoma-se, então, a indagação: ser quem você é ou ser quem você quer ser?

- Quem realmente é?

- Quem não quer ser?

Existe alguém capaz de esquecer-se para poder viver (ou "viver") adequadamente? Alguém realmente é capaz de se possuir? O desejo de viver é maior que o de existir?

- Existir e viver são sinônimos?

"Penso logo existo";
"Penso logo vivo".

Qual a diferença elementar entre essas duas frases que as fazem parecer superficialmente iguais, mas essencialmente diferentes?
- São?
Ou é apenas mais uma intuição de alguém que não sabe organizar sua psiquê?
Talvez.

Enquanto a hora passa impiedosamente a vida fica;
se repete constantemente.
É por isso que a imortalidade carnal é utópica. Se o tempo fosse um homem, imagine o quão amargurado ele seria consigo mesmo: ver todos passarem. Lotes e lotes de gente, como numa estação de trem.

(continuação: Estação de trem)

quarta-feira, 7 de março de 2012

2 anos depois...

Solidão

Não acredito que haja um local ideal à reflexão dentro de um grupo. Estão todos preocupados demais em rir, se divertir, em esquecer a vida por alguns instantes. Acredito que um homem é o que pensa e - para pensar - há de se abster das suas companhias. Vejo no homem que busca a solidão o engrandecimento - talvez ande junto com o desgosto o crescimento pessoal.
O desgosto pelo homem em si: quem sabe não seja esta uma característica subvalorizada pela maioria que aceita o homem como máquina e não como cérebro? Aceita o tempo como inimigo, mas não acolhe sua essência. Talvez seja o mal do homem preocupar-se demais em viver: a vida vivida como tem de ser, a vida gasta, a vida comprada. O estilo, não a arte. O momento, não a eternidade. As atitudes, não os princípios.
Talvez por isso a sociabilidade seja o perigo por trás do riso: um vício. O vício da felicidade tras a morte subjetiva. E, talvez por isso, sejam os mais solitários os mais sábios. Contudo, não há de ser a solidão forçada, mas a abraçada; a solidão que se aprende, a poeira sobre a mesa - abismo social. Talvez seja essa uma característica inerente a tampoucas pessoas, talvez, talvez...
O existencialismo para alguns pode ser deveras conflituoso e, quem sabe um dia, possamos nos aceitar como somos...

- Quando deixarmos de querer ser alguém para ser alguém?

- Quem sou eu além de uma cópia de quem admiro?

Um dia, acredito, a maioria das pessoas aprenda a abster-se de seu existencialismo para aceitar que, de fato, existe - e não há nada a ser feito sobre isso, ou refletido. Aceitar-se é o caminho mais curto para a sobriedade, a convicção em si.
Mas ser convicto de seus princípios é, necessariamente, ser convicto em si?

(Continuação: "Clima")